sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O que acontece no bloco europeu?

Imagine uma família com o casal mais dois filhos, ou seja, quatro pessoas no mesmo teto. Já é difícil com essas pessoas de mesma cultura chegar a algum denominador comum quando existe uma decisão que determinará o futuro da família, imagine se nessa casa entra o primo bastardo da mulher de seu cunhado e começa a colocar ordens na comida que comes sem o seu consentimento? É isso que está acontecendo na Europa atualmente.

A Alemanha é um país de cultura ortodoxa. O povo alemão é conservador e bastante seguro de suas decisões e cobra de seus representantes a mesma postura de um pai de família que não aceita que seu filho chegue fora do horário estipulado em sua casa. Regras são regras! É um povo que não aceita ser enganado e que não engana para manter o respeito.

Na outra ponta temos países que gostam de uma cerveja a mais, quando o corpo está no limite do álcool. Esses países são mais heterodoxos (não quer ser heterodoxo seja um mal em si, mas a maioria é keynesiana). Quais sejam: Itália, Espanha, Portugal e, principalmente, Grécia. Eu diria que esses países são o primo bastardo do exemplo acima.

Se você aceitar o primo bastardo em sua casa e suas orientações sobre seus costumes, não se arrependa depois de sua escolha. Foi o que aconteceu com a União Européia. Países historicamente mais conservadores com suas finanças aceitaram uma moeda que circularia pela zona do euro com países com problemas fiscais sérios e que recorrem à emissão de títulos públicos para rolar suas dívidas.

Para que serve a moeda? A moeda é utilizada como meio de troca entre bens produzidos na economia real. Ela quem determina o valor dos bens ao preço aceitável pelo mercado e que garante que as trocas sejam efetivas entre os agentes. Logo, sua produção é correspondente a dinâmica real a partir da demanda e oferta de determinada economia.

A partir daí eu insiro na economia uma nova moeda que circulará entre os países membros, cada um a sua característica e costumes. Com certeza teremos um problema real. Esse problema abrange todos os mecanismos reais de uma economia como o mercado de trabalho. Vamos pegar o exemplo da Grécia e da Alemanha para detalhar melhor a análise.

Imagine que os países produzem canetas e competem diretamente nesse mercado em escala global. Vamos analisar em dois tempos essa questão:

1. O primeiro momento não existe o euro como moeda unificadora e que cada país tem em seu banco central o poder de emissão de moedas domésticas;

2. O segundo momento é com a entrada do euro como moeda de circulação entre os países membros e que os bancos centrais dos países membros emitam títulos para rolarem suas dívidas e aumentarem suas reservas em euro.

Vamos agora inserir no exemplo esses dois momentos. Mas antes de comentarmos os resultados, acrescento a produtividade média de cada país: na Grécia para produzir uma caneta um trabalhador leva uma hora, enquanto na Alemanha a mesma caneta é produzida por um quarto do tempo, ou seja, em quinze minutos. O salário de uma hora na Grécia vale duas horas de trabalho na Alemanha. Dessa forma, em uma hora de trabalho a Grécia criou uma caneta, enquanto a Alemanha produziu quatro canetas e o trabalhador grego recebeu duas vezes mais que o trabalhador alemão. Para o alemão receber o mesmo salário que o grego ele deverá trabalhar duas horas, mesmo sendo mais eficiente que o grego.

Agora vamos aos resultados. No primeiro momento percebe-se claramente que a moeda alemã é mais valorizada que a moeda grega, já que o banco central grego precisa emitir mais moedas para responder pela dinâmica da economia real, enquanto na Alemanha o banco central não necessita ligar a máquina muitas vezes para imprimir moeda. Assim sendo, a economia alemã é mais estável que a economia grega, que está última mais suscetível a choques de oferta e inflação monetária.

Transportando essa análise para escala global, perceberemos mais canetas alemãs do que canetas gregas, já que a caneta é uma commodity e seu preço é internacional. Ganhou a Alemanha nesse exemplo com a Grécia.

Agora vamos para o segundo momento. Com a moeda unificada o trabalhador grego deverá aumentar sua produtividade ou aceitar ter uma redução salarial. Para isso, os sindicatos deverão ser mais flexíveis e aceitar a competição com o trabalhador alemão mais eficiente. Outra forma de resolver a questão é com a vantagem comparativa descrita por David Ricardo e os gregos se especializarem em outra profissão em vez de produzirem canetas. Essa é a razão mais racional para aceitar uma moeda em circulação supranacional.

Os gregos aceitaram isso? Lógico que não! A moeda grega não se valorizaria mais devido a impressão de sua moeda em relação à criação de moeda alemã pelos seus bancos centrais. A moeda agora era única. Qual o método utilizado então pelos gregos para adquirir euro acima da produtividade de sua economia real? Emitindo títulos públicos e endividando o governo grego. Os outros países da zona do euro compravam esses títulos e, de quebra, a Grécia incorria em déficits externos para estimular sua economia real.

Com a entrada de euro lastreado por títulos públicos, eleva-se a inflação monetária, já que o dinheiro fácil que entra na economia cria desequilíbrios fiscais e, como a moeda é comum, ela se alastra pelos outros países membros. É como se você estivesse na praia e gostasse de chegar por volta das 10h00 e outra pessoa a utilizasse sempre antes de você, por volta das 08h00. Só que você não sabe que essa pessoa que usa antes de você suja a água toda e esconde os dejetos na areia, sendo que você é totalmente ao contrário. A falta de definição do direito de propriedade faz com o que o bem comum crie ineficiências de mercado.

Estes são alguns dos pontos que a zona do euro está uma verdadeira zona, no sentido literal da palavra. E não culpe a economia de mercado por isso. Como diria a escola austríaca de economia: a razão de vários desequilíbrios econômicos, na maioria das vezes, é causada pelo governo em seu poder de criar moedas.

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